Os Transtornos de Personalidade, também referidos como Perturbações da Personalidade, formam uma classe de transtorno mental que se caracteriza por padrões de interação interpessoais tão desviantes da norma, que o desempenho do indivíduo tanto na área profissional como em sua vida privada pode ficar comprometido. Na maior parte das vezes, os sintomas são vivenciados pelo indivíduo como “normais” (eu-sintônico), de forma que a diagnose somente pode ser estabelecida a partir de uma perspectiva exterior.
Mais do que outros transtornos
mentais, os transtornos da personalidade apresentam o perigo de uma
estigmatização do paciente. Isso se deve sobretudo à terminologia, que sugere
um transtorno de toda a personalidade do indivíduo e, muitas vezes, está ligada
a juízos morais com relação ao paciente. Os atuais sistemas de classificação
(DSM-V e CID-10) – que utilizam o método descritivo e não etiológico –
permitiram o desenvolvimento de novas abordagens, que procuram descrever tais
transtornos como transtornos da interação interpessoal e levaram ao
desenvolvimento de novos tratamentos psicoterapêuticos.
No Brasil existe pouco material
publicado na área, sendo uma das áreas de pesquisa em psicologia e psiquiatria
com maior escassez de publicações científicas.
Critérios de diagnóstico do
DSM-IV- Transtornos de personalidade
fazem parte do Eixo II do manual psiquiátrico DSM-IV-TR, da Associação
Americana de Psiquiatria.
O diagnóstico de um transtorno
de personalidade deve satisfazer os critérios abaixo, juntamente com os
critérios específicos do transtorno em consideração.
- Comportamento e experiências que se desviam
consideravelmente do que a cultura vigente espera. Esse padrão é
manifestado em duas (ou mais) áreas seguintes:
- Cognição (percepção de si mesmo, dos outros ou de
eventos)
- Afeto (o alcance, a intensidade, a maleabilidade e
a conveniência das respostas emocionais)
- Funcionamento interpessoal
- Controle do impulso
- O comportamento é inflexível e invasivo, com
alcance em ampla gama de situações pessoais e sociais.
- O comportamento leva clinicamente a um significante
desconforto e prejuízo nas áreas de funcionamento social e ocupacional, ou
outra área importante de funcionamento.
- O padrão é estável, de longa duração e deve
iniciar, pelo menos, na adolescência ou início da idade adulta.
- O comportamento não pode ser identificado como uma
manifestação ou consequência de outra doença mental.
- O comportamento não pode ser identificado como uma
manifestação ou consequência de causas fisiológicas como abuso de
substâncias ou uma condição médica geral tal como dano cerebral.
Pessoas menores de idade que
alcancem o critério de um transtorno de personalidade não são, usualmente,
diagnosticadas como tendo tal transtorno, ainda, elas podem receber um diagnóstico
correlacionado. Para se diagnosticar um indivíduo menor de idade com um
transtorno de personalidade, os sintomas devem estar presentes por, pelo menos,
um ano. O transtorno de personalidade antissocial não pode, por definição, ser
diagnosticado em pessoas menores de 18 anos.
Lista de transtornos de
personalidade definidos no DSM-IV
Grupo A (Transtornos
Excêntricos ou Estranhos)
Os indivíduos que estão neste
grupo, costumam ser apelidados como esquisitos, isolados socialmente, frios
emocionalmente, inexpressivos, distantes e muito desconfiados. Este grupo está
mais propenso a desenvolver sintomas psicóticos.
Transtorno de personalidade
esquizoide ― Indivíduos isolados socialmente, não expressam ou
vivenciam emoções como alegria ou raiva, frios emocionalmente, indiferentes e
não fazem questão de manter laços afetivos com outras pessoas, sendo assim,
vistos como independentes emocionalmente. São muito introspectivos, e muitas
vezes não têm amizades. Não anseiam por tais relacionamentos e geralmente preferem
viver sozinhos e isolados. (Não confundir com depressão nervosa grave.)
Transtorno de personalidade
esquizotípica ― Pessoas com as mesmas características ao esquizoide,
contudo, estão mais próximas à esquizofrenia. Desconfiados, alguns podem
acreditar que têm poderes especiais, outros podem ser supersticiosos e cheios
de “manias”, sendo que geralmente possuem crença excessiva ou fanatismo
religioso. Frequentemente participam de seitas excêntricas, ou acabam por se
apegar excessivamente a alguma forma de “ocultismo” ou religiosidade, muitas
vezes tornam-se fanáticos religiosos que passam a vida a “pregar” seus
conceitos de forma exagerada, acreditando serem escolhidos por alguma entidade
divina ou, ocasionalmente, acreditam sentir presença ocultas, ouvir vozes e
chamados do além, entre outros comportamentos próximos às psicoses. (Não
confundir com esquizofrenia.)
Transtorno de personalidade paranoide ―
São pessoas demasiadamente desconfiadas e paranoicas. Não conseguem confiar em
outros, sempre alegam que vão ser passados para trás ou que estão tramando e
conspirando algo contra ele. Em momentos de estresse, essas características
tendem a piorar e são essencialmente rancorosos, com dificuldade em perdoar os
erros e fracassos das outras pessoas. Atribuem isso sempre às supostas
tramoias, conspirações, perseguições etc. São frios emocionalmente e podem se
manter distantes às outras pessoas porque acreditam estar sempre sendo
enganados, às vezes reagindo com hostilidade por motivos incompreensíveis aos
olhos de outros. (Não confundir com esquizofrenia ou delírio.)
Grupo B (Transtornos
Dramáticos, Imprevisíveis ou Irregulares)
Pessoas que convivem intimamente
costumam perceber um quê de anormal no comportamento dos indivíduos que compõem
este grupo, frequentemente sendo apelidados como “problemáticos”. Nele, estão
presentes os indivíduos que são vistos aos olhos de outros como manipuladores,
rebeldes, com tendência a quebrar regras e rotinas, irritantes, “maus”,
inconstantes, impulsivos, dramáticos, sedutores, imprevisíveis, egoístas e
muito intolerante às decepções. Neste grupo, os sintomas inflexíveis dos
distúrbios afetam muito mais as pessoas em sua volta, do que o próprio
indivíduo.
Transtorno de personalidade
antissocial ― São sociopatas, indivíduos egocêntricos desde a
adolescência e que mesmo na idade adulta mantêm comportamentos persistentes de
desrespeito às normas, regras ou leis sociais. Causam prejuízos e transtornos
significativos as pessoas próximas em seu círculo social. Frequentemente surgem
ocorrências de transtorno de conduta e histórico de problemas em relação
conjugal devido sua propensão para adultério e infidelidade. Não desenvolvem
empatia e tendem a ser insensíveis, cínicos e a desprezar os sentimentos,
direitos e sofrimentos alheios. Impera o egoísmo. Enganam, seduzem e manipulam
as pessoas a fim de obter vantagens pessoais ou prazer. São capazes de fingir
um comportamento exemplar e se fazer passar por vitima com maestria. Distorcem
fatos e acontecimentos verídicos a fim de convencer quem lhes dá atenção. (O
diagnóstico de antissocial não está relacionado a evitar socializações, algo
mais provável no transtorno de personalidade esquiva.)
Transtorno de personalidade
histriônica ― São pessoas muito emotivas, hipersensíveis, exageradas,
superficiais, emocionalmente instáveis, dramáticas, muito preocupadas com a
aparência física (vaidosos e provocativos) e com notável tendência a exigir
excessiva atenção para si a todo momento. Caso contrário, sentem-se
profundamente incomodados, podendo expressar suas emoções de forma exagerada,
como rompantes de choro ou raiva por coisa mínima. Geralmente vestem-se de
maneira chamativa, sobretudo sexualmente provocante e costumam estar sempre à caça
de elogios a respeito de sua aparência física. Tendem a infidelidade contumaz,
são muito manipuladores, sedutores, controlando pessoas e circunstâncias para
conseguir atenção. Fazem uso da manipulação emocional e sedutora,
frequentemente vestindo-se de maneira chamativa, provocando, encantando e
seduzindo outras pessoas. (Não confundir com Transtorno Afetivo Bipolar.)
Transtorno de personalidade
borderline ― Distúrbio comparável a uma “doença do amor”, uma vez que
seus sintomas tornam-se muito exacerbados quando apaixonam-se. São indivíduos
muito inconstantes, exagerados, constantemente insatisfeitos, intolerante às
decepções e frustrações, com pensamento extremista 8-80 (totalmente bom ou
totalmente mau: não conseguem ver lado bom e ruim numa mesma pessoa ou
situação), não conseguindo relacionar-se de maneira saudável com seus
familiares e pessoas íntimas, tratando-as frequentemente de maneira estúpida,
agressiva ou rebelde. Quando se apaixonam por uma pessoa, tratam-na como um
deus, entretanto, à menor contrariedade ou sinal de rejeição percebida,
acreditam erroneamente estar sendo ignorados e abandonados, tornando-se
irritantes, insuportáveis e autodestrutivos passando drasticamente do amor
idealizado para o ódio, tratando cruelmente o parceiro como um verdadeiro
demônio, sendo assim, com notável tendência a terminar relacionamentos de forma
raivosa. Essas relações íntimas são frequentemente intensas, mas caóticas e
instáveis, terminando sempre em chantagens, manipulações, ameaças suicidas ou
autodestrutivas. Essas pessoas têm profundos sentimentos de raiva e vazio
crônico, são emocionalmente instáveis, com surtos de carência afetiva,
mostrando-se também controladoras e muito ciumentas. Além disso, têm tendência
suicida e, a fim de se libertar do sentimento de vazio e rejeição, podem
engajar-se em comportamentos compulsivos como automutilação, comer
compulsivamente, gastos em excesso etc. São irritadiças quando estão com
pessoas muito íntimas e se sentem merecedoras de cuidados e atenção especial a
todo momento. Muitas vezes não conseguem controlar fortes emoções como a raiva.
Sentem-se sempre mal amados, rejeitados e ignorados por motivos banais, o que
causa um gatilho para agressividade e manipulações. São pessoas manipuladoras,
uma vez que temem ser rejeitados em seus relacionamentos amorosos, fazendo
esforços totalmente desproporcionais para evitar o abandono. (Não confundir com
Transtorno Afetivo Bipolar.)
Transtorno de personalidade
narcisista ― Pessoas arrogantes, orgulhosas e que se acham superiores
e mais especiais que os outros. De primeira, esses indivíduos passam uma grande
impressão de que são metidos, egoístas ou antipáticos, demonstram pouca empatia
para com os outros, não se importam com sentimentos alheios e podem ser frios
emocionalmente. Quase sempre se acham “os melhores”, “os mais lindos”, “os mais
ricos” etc. e exigem ser atendidos pelos melhores médicos, pelos melhores
professores e outros “melhores” profissionais por causa de seu sentimento de
superioridade. Diferentemente do histriônico, narcisistas podem se cuidar em
excesso (vaidosos) para mostrar às outras pessoas o quanto são mais “bonitos” e
anseiam por elogios não para receber atenção, mas apenas para mostrar que são
supostamente superiores às outras pessoas.
Grupo C (Transtornos Ansiosos
ou Receosos)
Os indivíduos que compõem este
grupo são vistos como medrosos, ansiosos, frágeis, dependentes, fóbicos e com
tendência a serem submissos, organizados, obedientes e, ao contrário do grupo
B, evitam quebrar regras ou rotinas. Neste grupo, frequentemente os traços
inflexíveis dos transtornos prejudicam muito mais o próprio indivíduo, do que
as pessoas à sua volta. Este grupo está mais propenso aos transtornos de
ansiedade.
Transtorno de personalidade
dependente ― Pessoas muito dependentes emocionalmente e fisicamente,
sempre dependendo de outras pessoas para fazer qualquer coisa. Notavelmente
carentes, elas não conseguem viver só e estão sempre à procura de um
relacionamento íntimo para se manter dependente. Com frequência, são submissos
às pessoas por quais mantêm um laço afetivo, podendo demonstrar muita empatia
ou altruísmo por outras pessoas e pouca preocupação consigo mesmo. Não costumam
contrariar as outras pessoas e emoções como raiva e desgosto frequentemente são
reprimidas e disfarçadas, pois têm medo excessivo em magoar o outro. Com medo
da perda e abandono, esses indivíduos pensam muito mais nas outras pessoas do
que em si, deixando de fazer coisas que gostam, para satisfazer aos outros.
Eles são propensos a envolverem-se em relacionamentos perturbadores, com
tendências sadomasoquistas, muitas vezes aceitando atitudes abusivas contra si.
Por isso, a insatisfação é constante e o sentimento crônico de tristeza é comum
nessas pessoas, uma vez que tornam-se pessoas excessivamente submissas aos
outros, muitas vezes deixando-se ser vítimas de maus tratos por parte de outras
pessoas por quais mantêm dependência. Geralmente, possuem medo de machucar o
outro e têm dificuldade em romper tais relacionamentos. Quando terminam,
sentem-se culpados e frequentemente partem desesperadamente em busca de um novo
relacionamento. (Não confundir com distimia.)
Transtorno de personalidade
esquiva ― Indivíduos que são excessivamente tímidos, com grande
ansiedade na vida social, sendo que frequentemente carregam um sentimento de
inferioridade em relação às outras pessoas. Via de regra, têm uma baixa
auto-estima e temem serem ridicularizados ou criticados em público. Na
realidade, anseiam contato íntimo entre as pessoas, mas com medo de serem
ridicularizados, envergonham-se e se isolam socialmente. Eles podem evitar
festas, lugares cheios de pessoas e outras ocasiões sociais que poderão ser o
centro das atenções, sendo que muitas vezes não têm amigos. Por vezes, carregam
grande sofrimento pois têm uma grande vontade de se relacionar com outros, mas
não conseguem por conta da vergonha e timidez excessiva que enfrentam ao
deparar-se com outras pessoas. (Não confundir com depressão nervosa grave,
fobia social e transtorno de ansiedade generalizada.)
Transtorno de personalidade
obsessivo-compulsiva ― São pessoas teimosas e inflexíveis,
excessivamente organizadas, temendo descuidos, desorganizações, sujeira ou
qualquer outra forma de “bagunça”. Elas priorizam o correto e organizado,
podendo gastar muito tempo trabalhando, estudando ou limpando, deixando de lado
relacionamentos, diversão e lazer. Além disso, elas tendem a fazer seus deveres
a sós porque temem que outras pessoas não irão fazer corretamente. Nos seus
relacionamentos, eles podem ser um pouco distantes ou isolados e aparentar
frieza emocional. Com frequência têm dificuldade em desfazer-se de velharias e
coleções, podendo acumular muitos utensílios, móveis e objetos antigos. Via de
regra, se sobrecarregam em suas atividades, algumas vezes desenvolvem compulsão
desenfreada para o trabalho. (Não confundir com Transtorno obsessivo-compulsivo
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